segunda-feira, 15 de agosto de 2011

A MARCHA DA MACONHA
DIREITO & JUSTIçA

Não é possível vislumbrar como se possa realizar marcha pela maconha, sem que esta marcha represente uma promoção de seu uso
O Supremo Tribunal Federal reconheceu que a maconha é uma droga e que não se pode promover seu uso. Curiosamente, considerou que, pelo princípio da liberdade de expressão e de ir e vir, não se poderia proibir as marchas para sua descriminalização.


Considero muito difícil entender as duas teses conflitantes abordadas pelos eminentes ministros, pois o simples fato de se defender a descriminalização da maconha para seu livre uso, é forma de incentivá-lo. Mais curioso ainda é que o Estado Brasileiro tudo fez para eliminar o uso do cigarro, incomensuravelmente menos nocivo à saúde que a maconha. Perguntava-me, com sua inteligência e ironia, Everardo Maciel, se for descriminalizada, sua venda deveria ser mais tributada que o cigarro, já que é inequivocamente mais prejudicial.


Pelo princípio da liberdade de expressão e de associação, poderiam os cidadãos descontentes com o alto nível de corrupção nas diversas esferas da Federação, defender, em passeata, uma ditadura de homens bons para substituir esta democracia. E se houvesse uma marcha para a descriminalização da cocaína e do crack, seria também possível?


E eventuais marchas para a descriminalização da cocaína e do crack ou de outras drogas para serem permitidas estariam sujeitas a laudos laboratoriais dizendo que a maconha é uma droga menos nociva? Caberia ao Supremo Tribunal Federal definir os casos em que a liberdade de expressão e associação estariam condicionadas a laudos técnicos para permitir tais marchas?


Decididamente, com todo o respeito que tenho pelo Pretório Excelso há 54 anos e em especial pelos Ministros da atual Corte, a decisão não foi feliz. Foi “politicamente correta” para agradar ala de intelectuais dos “novos tempos” em que tudo é permitido, principalmente quando agredindo valores.


Em palestra que proferi, recentemente, na qual se discutiam outras decisões polêmicas do Tribunal Maior e a desfiguração do princípio da moralidade em todos os níveis de governo, um dos participantes perguntou-me se o Brasil hoje não tinha um Poder Judiciário “politicamente correto”, um Poder Executivo “politicamente corrupto” e um Poder Legislativo “politicamente incompetente”, tendo sido sua observação, difícil de responder, sido seguida de risos e aplausos. Creio que a marcha da maconha fortalece a opinião dos que pensam como este participante, que me fez lembrar outro episódio provocado por recente artigo que escrevi e que mereceu de Saulo Ramos, ao cuidar da unanimidade do Pretório Excelso nas interpretações “conforme” a Lei Maior, que estas unanimidades são “conforme” Nelson Rodrigues.


Decididamente, na minha limitação etária de 76 anos, não consigo vislumbrar como se possa realizar marcha pela maconha, sem que esta marcha represente uma promoção de seu uso.

*Ives Gandra da Silva Martins é advogado, professor Emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio e membro do Conselho de Notáveis da Unisescon.





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